Lula reforça compromisso ambiental e indígena em discursos de posse
Presidente afirma que vai revogar “todas as injustiças contra os povos indígenas” e sobe rampa do Planalto com cacique Raoni e outros representantes da sociedade
Em discurso de posse neste domingo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou o compromisso ambiental declarado durante e após a campanha eleitoral: “Nossa meta é alcançar o desmatamento zero na Amazônia e a emissão zero de gases de efeito estufa na matriz energética”, afirmou Lula no Congresso. Em seguida, no parlatório, ele disse que o objetivo do inédito Ministério dos Povos Indígenas é “combater 500 anos de desigualdade”.
Em ato marcado por simbolismo, o presidente subiu a rampa do Palácio do Planalto com “brasileiros e brasileiras”: a catadora de material reciclável Aline Sousa, o líder indígena Raoni Metuktire, um metalúrgico, um professor, uma cozinheira, um artesão, um menino negro da periferia e um jovem ativista com paralisia cerebral, vítima da meningite, além da cachorinha Resistência. A faixa presidencial foi entregue por Aline – Bolsonaro se recusou a passá-la ao sucessor e embarcou para os EUA na antevéspera da posse.
A presença do cacique kayapó ao lado de Lula é emblemática por se tratar de um símbolo da luta indígena (inclusive contra Belo Monte, usina construída pelo PT na Amazônia) reconhecido internacionalmente e porque Raoni foi atacado diretamente por Bolsonaro em discurso na Assembleia Geral da ONU em 2019.
Após receber chefes de Estado, Lula assinou decreto que restabelece o Fundo Amazônia, permitindo o uso de mais de R$ 3 bilhões paralisados desde 2019, e revogou ato que incentivava o garimpo ilegal em terras indígenas e unidades de conservação, entre outras medidas.
No discurso do Congresso, o presidente afirmou que vai revogar “todas as injustiças contra os povos indígenas” assinadas nos últimos quatro anos.
Numa das raras menções ao agro, Lula disse que fará o que chamou de “transição energética e ecológica para uma agropecuária e uma mineração sustentáveis, uma agricultura familiar mais forte, uma indústria mais verde”. Segundo ele, o país deve estimular o reaproveitamento de pastagens degradadas e “não precisa desmatar para manter e ampliar sua estratégica fronteira agrícola”. “Incentivaremos, sim, a prosperidade na terra. Liberdade e oportunidade de criar, plantar e colher continuará sendo nosso objetivo. O que não podemos admitir é que seja uma terra sem lei. Não vamos tolerar a violência contra os pequenos, o desmatamento e a degradação do ambiente, que tanto mal já fizeram ao país.”
Essa é uma das razões, disse ele, para a criação do Ministério dos Povos Indígenas. “Ninguém conhece melhor nossas florestas nem é mais capaz de defendê-las. Cada terra demarcada é uma nova área de proteção ambiental. A estes brasileiros e brasileiras devemos respeito e com eles temos uma dívida histórica.” Lula afirmou que os indígenas não são obstáculos ao desenvolvimento, como alegava falsamente Bolsonaro, que não demarcou nenhuma terra indígena em seu mandato.
O presidente focou seus dois discursos na defesa da democracia e no combate à desigualdade e ao racismo. Chorou ao mencionar a volta do país ao mapa da fome. Não citou o nome de Bolsonaro, mas repetiu duas dezes a palavra genocídio ao resumir sua gestão, definida como “negacionista, obscurantista e insensível à vida”. “O que o povo brasileiro sofreu nestes últimos anos foi a lenta e progressiva construção de um genocídio”, discursou no parlatório. Em seguida, o público gritou: “Sem anistia!”
Apesar da ressalva de que não haveria “ânimo de revanche”, Lula afirmou no Congresso que vai “garantir o primado da lei” e que “quem errou responderá por seus erros”. “O mandato que recebemos, frente a adversários inspirados no fascismo, será defendido com os poderes que a Constituição confere à democracia.”