Ondas de calor já ameaçam 350 milhões
Estudo mede a probabilidade de calor extremo atingir principais cidades do planeta e conclui que frequência desses eventos aumentará mesmo que aquecimento se mantenha abaixo de 1,5°C
LUCIANA VICÁRIA
DO OC
As temidas ondas de calor, como as que mataram cerca de 3.400 pessoas no sul da Ásia em 2015, nas cidades de Karachi (Paquistão) e Kolkata (Índia), onde as temperaturas bateram os 48ºC, devem se tornar ainda mais intensas, mesmo se a temperatura média do planeta se mantiver abaixo dos 1,5° C, limite ideal estabelecido pelo Acordo de Paris. É o que revela um estudo publicado nesta segunda-feira (27) pela revista científica americana Proceedings of the National Academy of Sciences.
O estudo analisou o estresse térmico de 44 cidades e identificou a capacidade de cada uma delas de registrar eventos de calor extremos. As mais vulneráveis, segundo eles, são Lagos, na Nigéria, e Xangai, na China, o que coloca a vida de 350 milhões de pessoas sob forte ameaça. Abidjan, na Costa do Marfim; e Cartum, no Sudão, completam o quarteto das cidades mais ameaçadas, sujeitas a fortes ondas de calor mesmo que a temperatura do planeta não ultrapasse o “limite de segurança”. Nova York e Rio de Janeiro se tornam suscetíveis às ondas de calor se o aumento médio da temperatura ultrapassar os 4°C até o final deste século.
O estresse térmico é um fenômeno que une duas variáveis explosivas: o aumento da temperatura do ar e o aumento do vapor de água da atmosfera. Juntos, eles diminuem a capacidade do ambiente de dissipar o próprio calor, elevam a sensação térmica a níveis perigosos para o ser humano e geram as perigosas ondas de calor. Uma vez que o aumento da temperatura média global do ar não é linear, estas ondas acontecem com mais frequência em alguns lugares que em outros.
De acordo com Beatriz Oliveira, da Rede Brasileira de Pesquisas em Mudanças Climáticas e da Fiocruz, países mais pobres que não se prepararem para essas ondas de calor podem registrar um grande número de óbitos em poucas horas, a exemplo do que ocorreu em 2015. “Em pouco tempo o corpo não consegue regular a própria temperatura e entra em um processo crítico que pode gerar a perda de funções vitais”, afirma.
No mercado de trabalho, as perdas causadas pelo calor já foram medidas. Até 2009, a América Latina já havia perdido 2% de suas horas de trabalho por estresse térmico. Em regiões como o Sudeste Asiático e o oeste da África, as perdas chegam a 7%. Hoje em dia, cerca de 10% a 15% das horas de trabalho no mundo já são quentes demais para a manter a produtividade.
As iniciativas ainda são poucas, mas já existem planos para mitigar os efeitos das ondas de calor em cidades onde elas devem se tornar mais frequentes. A cidade de Ahmadabad (Índia) implementou recentemente o primeiro plano abrangente de aquecimento da Ásia, que está servindo de exemplo para cidades vizinhas, que além de pobres, sofrem com o aumento populacional.