Acabar com os subsídios aos fósseis não salva o planeta das mudanças climáticas
Sem isenção de impostos, emissões cairiam no máximo 5% até 2030, menos do que o estabelecido pelo Acordo de Paris – e poderia dar novo ânimo à retomada do carvão em regiões mais pobres
Eliminar todos os subsídios aos combustíveis fósseis teria pouca influência no corte de gases de efeito estufa e na evolução da energia renovável no planeta, revelou um estudo publicado na última semana pela revista Nature. Se todos os governos do mundo passassem a cobrar integralmente os impostos de empresas de gás e de petróleo, as emissões de gás carbônico em 2030 seriam, no máximo, de 1% a 5% menores, independentemente do preço do petróleo.
Os pesquisadores usaram cinco modelos para a análise e consideraram a eliminação dos subsídios de 2020 até 2030. Nesses 10 anos com impostos, a indústria de combustíveis fósseis deixaria de emitir para a atmosfera de 0,5 a 2 gigatoneladas por ano de gás carbônico, um valor bem abaixo do estipulado pelas metas voluntárias (4 a 8 gigatoneladas por ano) assumidas pelas nações no acordo climático de Paris – e insuficientes para limitar o aquecimento em 2° C.
A remoção de subsídios também poderia significar perdas aos mais pobres, além de não estimular significativamente o uso de renováveis, de acordo com o Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicados, IIASA, organização de investigação científica localizada em Luxemburgo, na Áustria, responsável pelo estudo. “Quanto menor for a condição financeira, maior será o impacto negativo no orçamento das famílias”, disse Jessica Jewell pesquisadora de energia do IIASA e principal autora do estudo. “Além disso, se o preço do petróleo sobe, o carvão pode se tornar uma alternativa”.
A falta de subsídios teria efeito positivo em regiões que exportam petróleo e gás natural, como Rússia, América Latina, Oriente Médio e norte da África. Nessas regiões, a diminuição de gases de efeito estufa seria igual ou superior às promessas climáticas. “Essa é uma revelação importante do estudo. Acabar com os subsídios traz mais efeitos no Brasil do que em alguns países desenvolvidos; logo, o ideal é que o foco esteja nas regiões com melhores resultados”, diz Christoph Bertram, especialista em políticas climáticas, sistemas energéticos e estratégias de mitigação da mudança climática do Potsdam Institute for Climate Impact Research, na Alemanha. Os modelos sugerem, no entanto, um aumento das emissões na África e na Índia, como resultado da substituição do petróleo e do gás natural pelo carvão.
Para se ter uma ideia da distribuição dos subsídios, as três maiores regiões exportadoras de petróleo e gás natural: Oriente Médio, norte da África e América Latina ficam com cerca de dois terços de todos os subsídios de fósseis de todo o mundo em 2015. Na América Latina e no norte da África, metade dos subsídios são para o petróleo. Na Rússia, metade dos subsídios destinam-se ao gás natural e o restante à eletricidade (gerada a partir de gás natural). Os subsídios em regiões desenvolvidas (Europa, América do Norte e Pacífico da OCDE) representaram cerca de 13%, mas podem crescer muito no futuro.
Reduzir os subsídios pode ser uma estratégia interessante se estiver vinculada a políticas de redução de emissões, como o apoio a projetos ligados à energia limpa, aponta a pesquisa. No Brasil, entretanto, o que se faz até o momento é inflar ainda mais os subsídios ao petróleo, haja vista a recém-aprovada MP do Trilhão, que isenta de taxas de importação até 2040 multinacionais com interesses nos campos de petróleo brasileiros.