Candidata brasileira ao IPCC quer repensar era dos grandes relatórios
Thelma Krug diz que, se eleita para chefiar painel do clima, trabalhará para facilitar acesso de países pobres a publicações científicas
DO OC – O Itamaraty apresentou nesta segunda-feira (8) a cerca de 60 diplomatas estrangeiros a candidata do Brasil a chefiar o IPCC, o painel do clima das Nações Unidas. A matemática Thelma Krug, 72, atual vice-presidente do painel, concorrerá em julho ao posto hoje ocupado pelo coreano Hoesung Lee, e pode ser a primeira mulher e primeira latino-americana no cargo.
Krug falou ao corpo diplomático durante cerca de meia hora, ao lado do chanceler Mauro Vieira, da secretária-geral Maria Laura da Rocha e da secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni. Ela defendeu o papel das revisões dos governos no IPCC e disse ser necessário repensar o modelo de grandes relatórios do painel.
Desde 1990, o IPCC adota o modelo dos relatórios de avaliação (conhecidos pela sigla inglesa AR, assessment reports) publicados a cada cinco ou seis anos. Eles trazem, em 7.000 páginas cada um, o estado da arte do conhecimento humano sobre as três facetas mais importantes da mudança do clima: sua base física, adaptação e vulnerabilidades e mitigação (corte de emissões). Mas muitos países, numa avaliação interna recente feita pelo painel, consideram que esse modelo “oracular” envelheceu e não responde mais às necessidades das decisões políticas atuais.
O IPCC privilegia estudos publicados em periódicos com a chamada revisão por pares, que já embute algum tempo de depuração – pelo menos um ano – entre a descoberta original e sua publicação numa dessas revistas. Além disso, há uma data de corte para estudos que entram nas revisões periódicas do IPCC, o que faz com que haja sempre uma defasagem de quatro anos ou mais entre as conclusões do painel e a ciência de ponta.
Em 2007, por exemplo, quando o IPCC publicou sua estimativa de aumento do nível do mar de 59 cm, já havia estudos mais atualizados sobre degelo polar que elevariam a estimativa para quase 1 m, que ficaram de fora do relatório por terem sido publicados após a data de corte.
“Muitos veem que o importante para os formuladores de política e tomadores de decisão são sumários, sínteses mais específicas e mais focadas, que permitam que as decisões sejam tonadas de maneira tempestiva”, disse Thelma Krug. “Isso implicaria em que nós repensássemos a necessidade dos grandes relatórios, que já saem um pouco desatualizados.”
A cientista paulista disse ainda que pretende fortalecer a participação dos países em desenvolvimento no painel. Isso passa por facilitar o acesso a publicações científicas. “Muitas dessas publicações são pagas e muitos países em desenvolvimento não têm acesso a elas”, afirmou Krug. “Se o IPCC é a autoridade sempre reconhecida em nível internacional a gente não pode ter viés na pesquisa. A gente tem de buscar ter o melhor balanço possível na avaliação da literatura e tornar essa literatura disponível para esses países.”
Krug concorrerá com três outros cientistas pela presidência do painel: o belga Jean-Pascal van Yppeserle, que disputou em 2015 e perdeu para Lee, a sul-africana Debra Roberts, especialista em adaptação em cidades e co-presidente do Grupo 2 do painel (sobre adaptação), e o escocês Jim Skea, do Imperial College de Londres, ex-presidente do Grupo 3 (sobre mitigação).