Clima levará 50 anos para normalizar, diz meteorologista-chefe da ONU
Mas isso só se o Acordo de Paris for efetivamente implementado; para Peteri Taalas, da Organização Meteorológicas Mundial, “estamos no rumo de 3 a 5 graus de aquecimento”
DO OC – Se a humanidade tiver sucesso em implementar o objetivo mais ambicioso do Acordo de Paris e estabilizar o aquecimento global em 1,5oC, o mundo seguirá batendo recordes climáticos negativos até por volta de 2060. A avaliação sombria foi feita pelo finlandês Petteri Taalas, chefe da Organização Meteorológica Mudial (OMM), nesta segunda-feira (6) – que emendou, no entanto, que “até agora não estamos nos movendo nessa direção”.
Taalas apresentou à imprensa, na abertura da COP23, em Bonn, as conclusões preliminares do Estado do Clima Global, um relatório produzido anualmente pela OMM que registra as principais alterações do clima da Terra. Em 2017, o relatório contou com participação de outras nove agências da ONU, como o FMI, que estimou também as perdas de PIB causadas pelo aquecimento global no mundo.
O rosário de desgraças climáticas deste ano, desfiado pelo chefe da OMM na conferência de Fiji-Bonn, é conhecido de qualquer pessoa que não tenha acabado de chegar de Marte. Mas mesmo assim impressiona quando mostrado em conjunto: 2017 será o segundo ou terceiro ano mais quente de todos os tempos desde o início das medições, em 1880, e o mais quente da história sem El Niño, superando de longe 2014; entre janeiro e setembro, a temperatura ficou 1,1oC acima da média de 1880 a 1900; as concentrações de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera em 2016 foram as maiores em 3 milhões de anos, ultrapassando 403 partes por milhão, mesmo num ano em que as emissões de carbono por uso de energia não cresceram; recordes também foram batidos nas concentrações de metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), respectivamente o segundo e o terceiro gases de efeito estufa mais importantes.
A alta temperatura causou ondas de calor e incêndios florestais no sudoeste da Europa, na Califórnia e no Canadá; na Patagônia argentina, os termômetros bateram 43,5oC abaixo da latitude 45 Sul; secas agravaram guerras no Iêmen, no Sudão do Sul e na Somália.
E tudo isso para não falar na temporada de furacões de 2017, a mais cara de toda a história, com duas supertempestades (Harvey e Irma) tocando terra nos EUA, três furacões de categorias 4 e 5 se sucedendo em duas semanas e o furacão de categoria 5 mais duradouro da história, o Irma.
“A Organização Mundial da Saúde começa a ver um aumento no número de pessoas expostas a ondas de calor. São 175 milhões por ano”, disse Taalas. E as estimativas do FMI dão conta de que os países mais pobres da América Latina, da África, do Sudeste Asiático e da Oceania estão vendo um encolhimento de suas economias da ordem de 2% a 4% devido a mudanças decorrentes da elevação de 1oC na temperatura global.
Imagine agora que as discussões em Bonn visam tentar limitar o aquecimento a quase o dobro disso. Segundo o chefe da OMM, mesmo que esse esforço seja bem-sucedido e a humanidade consiga nos próximos 20 anos atingir a meta mais ambiciosa do Acordo de Paris, limitar o aquecimento a 1,5oC, o número de eventos extremos continuará crescendo por décadas.
“A coisa negativa sobre o sistema climático é que nós emitimos tanto que vai levar 50 anos para [o planeta] se recuperar, o que significa mais tendências negativas e mais recordes desconfortáveis”, disse Taalas. “Se nós conseguirmos implementar o Acordo de Paris, poderíamos ver uma redução disso a partir dos anos 2060. Caso contrário, claro, isso continuará por milhares de anos, dada a persistência do CO2 na atmosfera.”
O problema, afirmou, é que não há nada hoje que nos autorize a antever o melhor cenário. “Até aqui não temos caminhado nessa direção; caminhamos para 3oC a 5oC de aquecimento neste século.”
(CLAUDIO ANGELO)