Corte prejudicará fiscalização, diz Sirkis
Secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas diz que redução da verba do Ministério do Meio Ambiente é um "desatino"; chefe da Convenção do Clima evita criticar Trump
DO OC
O secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Alfredo Sirkis, afirmou que o corte de quase metade da verba do Ministério do Meio Ambiente, anunciado há uma semana pelo governo Temer, é “gravíssimo” e “vai prejudicar profundamente” a fiscalização do desmatamento – e, por consequência, as metas climáticas do Brasil.
Sirkis falou na última quarta-feira (5), durante audiência pública da Comissão Mista de Mudanças Climáticas do Congresso. A audiência teve a participação da secretária-executiva da Convenção do Clima das Nações Unidas, Patricia Espinosa, que visitou o Brasil nesta semana. Também participaram o embaixador José Antonio Marcondes, negociador-chefe do Brasil na Convenção do Clima, o cientista político Eduardo Viola, da UnB, e o coordenador de Mudanças Climáticas do WWF, André Nahur.
O MMA perdeu 43% de sua verba no contingenciamento de R$ 42,1 bilhões do orçamento do governo federal, anunciado na semana passada pela equipe econômica do governo. Foi uma das pastas que tiveram a maior redução percentual de orçamento na Esplanada – a média de corte foi de cerca de 30%.
Se forem incluídas na conta as verbas de emenda parlamentar, que também foram retidas, a tesourada fica ainda maior: 53% (na última sexta-feira, o OC publicou que a retenção fora de 51%, segundo dados fornecidos pela Receita, mas o Ministério do Planejamento considera uma verba um pouco maior, daí a discrepância).
Se a medida não for revertida, a pasta terá apenas R$ 446 milhões neste ano para financiar todas as atividades de controle ambiental federal: desde a fiscalização do desmatamento até a proteção de 76 milhões de hectares de unidades de conservação federais, passando pelo licenciamento de obras de infraestrutura até a alimentação de milhares de animais mantidos nos centros de triagem de fauna do Ibama no país inteiro.
Mesmo antes do corte, já não havia dinheiro para a fiscalização: desde o ano passado o Ibama precisa recorrer a R$ 53 milhões do Fundo Amazônia para manter as equipes vigiando a floresta. A presença ostensiva da fiscalização é vital, já que a taxa de desmatamento está em alta: nos últimos dois anos, o corte raso cresceu 60% na Amazônia, o que põe em risco a meta do Brasil de chegar a 2020 com a derrubada no patamar de 4.000 quilômetros quadrados (em 2016 ela chegou ao dobro disso).
O ministério ainda discute como absorver os cortes, mas uma fonte da pasta afirmou ao OC que o ministro Sarney Filho (PV-MA) tentará revertê-lo junto ao presidente. O argumento é justamente o aumento do desmatamento, o que prejudica a imagem internacional do Brasil. Sarney também deverá apontar para a boa avaliação da área ambiental do governo – notada em pesquisa recente da Confederação Nacional da Indústria.
“Estou seguro de que esse desatino será revisto nos próximos dias”, afirmou Sirkis durante a audiência.
AUSENTE É ASSUNTO
A audiência também tratou das incertezas geradas por Donald Trump em relação ao Acordo de Paris. Espinosa, que já havia evitado fazer críticas ao americano mesmo depois de ele ter ameaçado retirar a contribuição financeira dos EUA à convenção, seguiu o mesmo mantra ontem: disse que não falaria sobre assuntos internos e que mantém o diálogo com as autoridades americanas. “Por ora, os EUA são partes do Acordo de Paris”.
O negociador-chefe do Brasil na convenção, José Antonio Marcondes, adicionou uma preocupação à lista: o que acontece com o combate à mudança climática na Europa após o Brexit. “Qual será a atuação dos EUA? E, com a saída do Reino Unido, como será dividido o bolo [das emissões] da UE? A divisão dessa torta ainda não é pública”, disse.
Marcondes afirmou, ainda, que o Brasil espera que neste ano seja enfim produzido o texto de negociação do “manual de operações” do Acordo de Paris.
Foto: Roque Sá/Agência Senado