Jovens ativistas protestam durante a COP26 (Foto: Felipe Werneck/OC)

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Governo perde na Justiça argumento sobre “pedalada” climática

TRF barra recurso da União que alegava que decisões sobre o Acordo de Paris não podiam ser dadas por tribunais brasileiros

27.04.2022 - Atualizado 11.03.2024 às 08:30 |

DO OC – O TRF (Tribunal Regional Federal) de São Paulo impôs uma derrota ao governo Bolsonaro ao confirmar, no último dia 19, que a Justiça brasileira tem competência para julgar violações cometidas pelo Brasil ao acordo do clima de Paris.

A desembargadora Marli Ferreira indeferiu um recurso da União que tentava impedir que tribunais nacionais julgassem a ação movida por seis jovens em 2021 que questiona a chamada “pedalada climática” da meta de clima do Brasil.

Na ação, os integrantes dos coletivos Engajamundo e Fridays For Future Brasil pedem a anulação da NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) apresentada pelo Brasil à UNFCCC (a Convenção do Clima da ONU) em dezembro de 2020. A peça argumenta que o país mudou para mais a base de cálculo das emissões da meta, proposta originalmente em 2015. Só que, nessa atualização, o governo não fez o ajuste correspondente no percentual de corte de emissão (43% até 2030 em relação a 2005). Com isso, o país inflava artificialmente seu compromisso internacional, dando-se o direito de emitir até 400 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2030 a mais do que na proposta de 2015 e, mesmo assim, cumprir a meta.

Como o Acordo de Paris veda expressamente alterações nas metas nacionais que reduzam sua ambição, argumentam os jovens, o Brasil estaria violando o tratado do clima. Mais do que isso, estaria violando também uma lei brasileira, já que o Acordo de Paris foi ratificado pelo Congresso Nacional e promulgado pelo presidente Michel Temer, por meio do decreto 9.073, de 2017.

O processo original foi impetrado na Justiça Federal de São Paulo. A União recorreu, argumentando que o Acordo de Paris é um ato que diz respeito apenas à política externa brasileira – e, portanto, qualquer decisão sobre ele seria prerrogativa apenas do Executivo. A estratégia era emplacar a tese de que o Judiciário brasileiro não tem competência para julgar nenhum ato ou omissão relativos ao acordo do clima e matar o processo na raiz. 

Só que a alegação dos réus não colou na primeira instância. A juíza do caso argumentou que (doh!) o Acordo de Paris, apesar de ser um instrumento internacional, fora ratificado pelo Congresso brasileiro e, portanto, tinha peso de lei doméstica. 

A União insistiu e recorreu à segunda instância, por meio de um agravo de instrumento. Mas a desembargadora do TRF manteve o entendimento da primeira instância. “Ao fazê-lo, a desembargadora deu sinal verde para que a primeira instância decida sobre a ação”, disse Paulo Busse, advogado dos proponentes. “Antes de ser uma comunicação à UNFCCC, a NDC do Brasil é um ato interno, feito no âmbito de uma lei brasileira. Por ser uma lei brasileira é claro que qualquer violação à NDC pode ser julgada por um tribunal brasileiro”, prosseguiu Busse.

Os ativistas comemoraram a decisão como uma vitória num caso que não tem precedentes na história jurídica do Brasil. “É até incoerente por parte da União argumentar que a NDC é uma questão externa, sendo que a própria sigla diz que se trata de uma contribuição nacionalmente determinada”, disse Walelasoetxeige (Txai) Suruí, uma das autoras do processo. “Se o nome é esse, como é que a gente vai dizer que o Brasil não poderia discutir isso [na Justiça]? Se o Brasil não pode discutir, quem pode?

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