Marina terá a missão de ser ela mesma, e ser outra
Nova ministra é o melhor nome para restabelecer a governança ambiental do país, mas enfrentará cenário mais difícil que em 2003 e resistências internas no governo
NOTA À IMPRENSA
O Observatório do Clima saúda a recondução de Marina Silva (Rede-SP) ao Ministério do Meio Ambiente, 20 anos depois de ter sido nomeada pela primeira vez.
A professora, ativista, ex-senadora e deputada federal eleita é globalmente reconhecida como principal artífice das políticas que levaram à queda consistente do desmatamento na Amazônia entre 2005 e 2012. É o melhor nome para restabelecer a governança ambiental do país, recuperar a imagem do Brasil e ajudar na transição para um novo modelo de desenvolvimento.
Ao se decidir, após uma década de afastamento, pelo “apoio programático” a Lula, em setembro, Marina deu peso e consistência ao programa ambiental do então candidato do PT. O aparente esverdeamento do presidente eleito, marcado no discurso histórico proferido na COP27, se deve em larga medida à influência da acreana.
No ministério, Marina terá a missão de ser ela mesma – a articuladora que se cercou de quadros técnicos e que soube usar sua influência política no passado para fazer avançar debates difíceis, como a meta de reduzir a taxa de desmatamento e a adoção de compromissos climáticos pelo Brasil. Porém, o país de 2023 é completamente diferente do de 2003, e a nova ministra também precisará ser distinta da Marina de duas décadas atrás para dar conta dos desafios.
Além de ter de remontar um ministério inteiro quase do zero após quatro anos de destruição, a ministra enfrentará um ambiente muito mais crispado na Amazônia, cujo desmatamento terá de controlar imediatamente. Se antes a devastação tinha origem em grande parte na agropecuária, hoje seu motor é o crime organizado de esbulho de terras públicas. O crime ambiental está mais ramificado, mais estruturado e, graças ao descontrole intencional do governo passado, mais armado também. Haverá resistência à presença do Estado. Parte do agronegócio também se radicalizou nos últimos quatro anos, o que pode dificultar conversas sérias e serenas sobre regulação – ainda que em benefício do próprio setor, hoje ameaçado por boicotes e embargos.
Caberá a Marina, ainda, lidar com um Congresso muito mais hostil, com presença ampliada da extrema-direita, além dos interesses antiambientais dentro da própria coalizão lulista. A demora injustificável de Lula em anunciar seu nome em meio à negociação para a montagem do gabinete foi um sinal preocupante de que a área ambiental pode ser menos estratégica para o governo do que indicou o discurso do presidente no Egito.
Por fim, a segunda passagem da ambientalista pelo ministério precisa entregar o que o PPCDAm (Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento) nunca fez: alternativas econômicas à exploração predatória dos ecossistemas brasileiros, que permitam gerar emprego e renda sem desmatamento, sem degradação e recuperando florestas na imensa área de pastagens degradadas de que o Brasil dispõe. A vantagem em relação a 2003 é que hoje as ferramentas técnicas, científicas e de políticas públicas para essa virada estão todas à mão; basta o poder público querer aplicá-las.
À sociedade civil, como a ministra sabe, cabe um apoio crítico à gestão. Conversar sempre, ajudar no que for possível e pressionar quando for necessário. Dialogar na diferença é uma prática antiga de Marina na vida pública. Após tanto tempo de interdição do Ministério do Meio Ambiente à sociedade civil, celebramos ambos, o diálogo e a diferença, em favor de uma agenda tão necessária e tão urgente ao país.
Bem-vinda de volta, Marina. Estaremos de olho.
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