Brasil está entre os países que podem ter ativos encalhados com o pico da demanda por petróleo (Foto: Tânia Rego/ABr)

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Mundo segue no rumo de aquecer 2,4°C, diz agência

Demanda por petróleo começa a cair nesta década, ameaçando planos de expansão fóssil; para alcançar meta de Paris, transição precisa ser mais rápida

16.10.2024 - Atualizado 16.10.2024 às 20:35 |

DO OC – Publicado nesta quarta-feira (16), o relatório anual World Energy Outlook mostrou que o crescimento das renováveis segue insuficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa pelo setor energético. Com as políticas atuais, o mundo caminha para um aquecimento de 2,4ºC acima dos níveis pré-industriais, afirmou o levantamento Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla e inglês). 

Segundo a IEA, o mundo entrará em um “um novo contexto energético” a partir de 2025. Os novos projetos de gás natural (sobretudo do Catar) e de petróleo (do Brasil, Canadá, Estados Unidos e Guiana, chamados de “o quarteto americano”) conduzirão a um crescimento significativo na oferta, enquanto o crescimento na demanda por energia de fontes fósseis se encerrará antes de 2030.  Isso pode levar, inclusive, a desafios econômicos – como ativos encalhados – para os países que insistirem na expansão de novos projetos fósseis. 

“As descobertas do relatório deste ano confirmam as do ano passado. Peguemos o petróleo como exemplo: a demanda vai atingir seu pico antes de 2030. Ainda usaremos petróleo por muitos anos – não significa que a demanda cessará imediatamente, a depender das políticas adotadas –, mas veremos o ponto máximo desse crescimento. Há muitas razões econômicas e tecnológicas para isso, e uma delas é o que está acontecendo no setor de transportes. Estamos vendo como os carros elétricos estão ganhando espaço nos mercados de carros significativamente”, afirmou Fatih Birol, diretor-executivo da IEA, na na coletiva que lançou o relatório. 

O ritmo da transição energética de fontes fósseis para renováveis, no entanto, ainda está desalinhado com a meta de  zerar emissões até 2050, o que é indispensável para que o planeta tenha uma chance de estabilizar o aquecimento em 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, como prevê o Acordo de Paris. Seguidas as políticas atuais, o pico de emissões deve ser atingido até o final desta década, em 2030. Apesar de essa ser uma boa notícia, ela é insuficiente: como já mostrou a ciência, as emissões não precisam apenas parar de subir, mas sim cair 43% até 2030, no caminho para as emissões líquidas zero em 2050.

 

A projeção de emissões globais do setor de energia até 2035 mostra o descompasso entre as políticas atuais (em azul) e as necessárias para a meta de zero emissões em 2050 

A IEA chama atenção, ainda, para a relação simbiótica entre a crise do clima e a insegurança energética: um setor de energia que não consegue superar a dependência dos fósseis se torna cada vez mais instável, já que os eventos climáticos extremos, mais frequentes e intensos em um planeta mais quente, colocam em xeque a operação segura e confiável dos sistemas. Ondas de calor, secas, inundações e tempestades, por exemplo, já são considerados desafios profundos para o funcionamento dos sistemas energéticos em várias partes do mundo. 

A participação dos fósseis no setor de energia em 2023 seguiu na casa dos 80%, como no ano passado. A cifra ajuda a dimensionar o longo caminho para “fazer a transição para longe dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos”, como decidiu de maneira inédita a última conferência do clima, a COP28, em Dubai. 


Índia, Sudeste Asiático, Oriente Médio e África, segundo a IEA, são as economias com maior crescimento projetado na demanda por energia, de acordo com o cenário de Políticas Declaradas (STEPS) analisado no relatório. Nesse cenário, a agência projeta tendências para o desenvolvimento do setor de energia considerando dados recentes do mercado, custos de implementação de novas tecnologias e as configurações políticas das diferentes regiões. 

O aumento da demanda por energia reflete o atual cenário do setor, ainda marcado por profundas desigualdades de acesso e insegurança energética, sobretudo nos países em desenvolvimento. No entanto, afirma a IEA, esse aumento na demanda não significa necessidade de novos projetos fósseis. Segundo o relatório, o desenvolvimento acelerado das energias renováveis indica que, até 2030, a economia global tem condições de continuar crescendo sem precisar abrir novos projetos fósseis. “O crescimento contínuo da demanda global de energia após 2030 pode ser atendido exclusivamente com energia limpa”, explica  o documento. 

As decisões dos países até agora, no entanto, têm caminhado no sentido contrário:  o levantamento da IEA mostra que, apesar do recorde de implantação de energias limpas, dois terços do aumento na demanda global de energia em 2023 foram atendidos por combustíveis fósseis, o que levou as emissões de CO2 relacionadas à energia a mais um recorde histórico no último ano. “As decisões de governos, investidores e consumidores muitas vezes perpetuam as falhas do sistema energético atual, em vez de empurrá-lo para um caminho mais limpo e seguro”, critica a agência. 

A contradição é destacada pela organização Oil Change International: “O World Energy Outlook  deixa claro que podemos encerrar a era dos combustíveis fósseis, mas os líderes globais precisam agir agora. A IEA aponta que a demanda por petróleo, carvão e gás vai atingir seu pico até 2030 mesmo com as políticas atuais, mas um futuro habitável depende de uma redução imediata e acelerada na produção de fósseis. O fracasso dos governos em encerrar a expansão dos fósseis está colocando milhões de vidas em perigo”, declarou Kelly Trout, diretor de pesquisa da organização. (LEILA SALIM)

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