O ministro da Casa Civil, Rui Costa, discursa no lançamento do Novo PAC (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

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Novo PAC prevê transição, mas destina R$ 335 bilhões para petróleo e gás

Pacote de infraestrutura defende sustentabilidade e economia verde, mas ainda fortalece fósseis e velha economia

15.08.2023 - Atualizado 11.03.2024 às 08:31 |

DO OC – Na última sexta-feira (11/8), o governo federal apresentou no Rio de Janeiro a nova versão do Programa de Aceleração do Crescimento e prometeu deixar no passado a visão que opõe o crescimento econômico à proteção ambiental. O Novo PAC – desenvolvimento e sustentabilidade terá investimentos de R$ 1,7 trilhão (R$1,4 trilhão até 2026, final do atual mandato presidencial) e foi anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o caminho que ajudará a “tornar o Brasil a grande potência sustentável do planeta”.

No entanto, um quinto (19,7%) de todo o investimento previsto será alocado nas áreas de petróleo e gás. O programa prevê, inclusive, a condução de estudos para a perfuração de três poços de petróleo na Bacia Potiguar, que faz parte da Margem Equatorial. Em maio, o Ibama negou a licença ambiental para exploração do bloco 59, na bacia da Foz do Amazonas, que também compõe a Margem Equatorial, e recomendou que a região seja objeto de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar.

O Novo PAC é composto por nove eixos de investimento, cada um deles desdobrado em subeixos. A área de petróleo e gás é um subeixo da transição e segurança energética. Do total de R$ 540,3 bilhões a serem investidos no eixo, R$ 335,1 bilhões (62%) são em projetos fósseis, de petróleo e gás. Para combustíveis de baixo carbono, o orçamento é de R$ 26,1 bilhões.

Além da transição e segurança energética, são eixos do Novo PAC: transporte eficiente e sustentável; infraestrutura social inclusiva; cidades sustentáveis e resilientes; água para todos; inclusão digital e conectividade; inovação para indústria da defesa; educação ciência e tecnologia; e saúde.

As contradições do novo pacote de infraestrutura refletem as disputas e contradições da própria coalizão que forma o governo. Nas negociações que antecederam a Cúpula da Amazônia, na semana passada, Lula pressionou – e foi derrotado – por uma meta comum para o desmatamento zero, ao mesmo tempo em que se opôs à também derrotada moratória aos fósseis proposta pelo presidente colombiano, Gustavo Petro. Às vésperas da Cúpula, Lula afirmou que os amapaenses poderiam “continuar sonhando” com o petróleo na Foz do Amazonas.

“Descarbonizar” aumentando a produção?

A alocação dos investimentos no subeixo de petróleo e gás reforça a lógica que a própria Petrobras vem utilizando para promover uma imagem sustentável. Os investimentos em “descarbonização” são destinados a tecnologias que diminuam as emissões de gases de efeito estufa no processo de produção. Ao mesmo tempo, pretende-se abrir novas fronteiras de exploração e seguir aumentando o volume da produção (e, consequentemente, as emissões, que estão majoritariamente concentradas na etapa de queima dos fósseis).

O Ministério das Minas e Energia já declarou que quer transformar o Brasil no quarto maior produtor de petróleo do mundo (atualmente, o país está na nona posição do ranking) e o Novo PAC, apesar dos esforços sustentáveis – como remeter obras ambientalmente controversas para mais estudos –, parece esbarrar neste objetivo.

O texto que apresenta o subeixo de petróleo e gás no programa confirma essa concepção, ao afirmar que “o Novo PAC promove a redução da dependência externa brasileira de combustíveis e derivados fósseis, elevando a produção de petróleo e gás natural de melhor qualidade, com poucos contaminantes e de baixo carbono. Especial atenção é dada a projetos que ampliam a atuação em energias renováveis, incluindo apoio e investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação, contribuindo para a transição energética no Brasil”.

Dos R$ 335,1 bilhões para petróleo e gás, 85% (R$ 286 bilhões) serão destinados ao desenvolvimento da produção. Outros R$ 2,1 bilhões estão reservados para a exploração marítima de poços de petróleo e R$ 11,3 bilhões para o refino. Já o investimento em tecnologias de “descarbonização” será de R$ 8,9 bilhões. O Brasil segue, dessa forma, ignorando o cenário traçado pela Agência Internacional de Energia em 2021, de que nenhum novo projeto de extração de combustíveis fósseis poderia acontecer no mundo a partir de então para viabilizar a contenção do aquecimento do planeta em 1,5ºC.

Ainda no eixo de transição e segurança energética, o subeixo geração de energia reforça a intenção de desenvolver a vocação renovável do país, destacando que o Brasil tem 83% de sua matriz elétrica nessas fontes. “A maior parte da energia adicional que será gerada no Novo PAC, 79%, será de fontes renováveis”, diz o texto.

Dos R$ 75,7 bilhões a serem investidos em geração de energia elétrica, R$ 41,5 serão destinados para energia solar e R$ 22 bilhões para eólica. As térmicas a gás, altamente poluentes, no entanto, também serão contempladas, com R$ 6,7 bilhões. Além disso, as térmicas nucleares (que, apesar de serem de baixo carbono, produzem resíduos radioativos e por isso não podem ser consideradas fontes limpas de energia) receberão R$ 1,9 bilhão.

Rodoviarismo ainda domina transportes

O eixo de transporte eficiente e sustentável, apesar do nome, continua tendo investimentos destinados prioritariamente à construção de rodovias. Do total de R$ 349,1 bilhões destinados ao eixo, as rodovias abocanham mais da metade, R$ 185,8 bilhões. As ferrovias ficam com R$ 94,2 bilhões, e as hidrovias, com R$ 4,1 bilhões. Além disso, os portos receberão R$ 54,8 bilhões e os aeroportos, R$ 10,2 bilhões.

O Novo PAC traz ainda uma referência à questionada ferrovia Ferrogrão (que ligaria Sinop, no Mato Grosso, ao porto de Miritituba, no Pará), planejada para escoar a produção de grãos do Centro-Oeste e que cortaria a floresta amazônica. O projeto será enviado para estudos.

Cidades e mudança do clima

Um dos pontos positivos aparece no eixo de cidades sustentáveis e resilientes. Há um subeixo específico para a prevenção a desastres, que aborda as consequências da emergência climática e dos eventos extremos, sobretudo entre a população mais vulnerável.

“Os efeitos da mudança do clima no planeta têm provocado desastres ambientais nas cidades. Apenas no ano de 2022, o Brasil registrou mais de 12 milhões de pessoas afetadas por desastres que causaram perdas humanas irreparáveis, além de danos e prejuízos que ultrapassaram os R$15 bilhões. As ocorrências atingem principalmente as populações que vivem em territórios periféricos e vulneráveis, que voltam a ser priorizadas pelo Novo PAC”, afirma o texto.

O subeixo receberá investimentos de R$14,9 bilhões e priorizará obras de contenção de encostas e drenagem urbana sustentável.

Transformação Ecológica

Outro ponto de destaque foi o anúncio de que o Novo PAC será combinado ao Plano de Transformação Ecológica coordenado pelo ministério da Fazenda. O ministro Fernando Haddad ressaltou a integração entre desenvolvimento e sustentabilidade como marca do modelo a ser implementado.

“O Brasil é um dos poucos países do mundo que tem uma aliança estratégica do Ministério da Fazenda com o Ministério do Meio Ambiente. Em geral essas áreas são vistas como adversárias. Como se olhar para o meio ambiente fosse voltar as costas para o desenvolvimento”, afirmou Haddad, acrescentando que o Brasil, por suas particularidades geopolíticas e geoambientais, “tem o dever de unir desenvolvimento e sustentabilidade. Essa unidade talvez seja o grande segredo do ciclo de desenvolvimento que se abre a partir de agora”.

Segundo Haddad, o Plano pretende unificar a defesa do meio ambiente e do clima ao combate à pobreza, considerando que o enfrentamento ao desmatamento, ao aquecimento global e às mudanças climáticas depende também da geração de emprego e renda para a população, com a construção de alternativas econômicas limpas e sustentáveis.

Entre as medidas apresentadas, estão a criação do mercado regulado de carbono, a emissão de títulos soberanos sustentáveis, a criação de uma taxonomia sustentável nacional (um sistema de classificação que defina o que são as “atividades verdes”) e a reformulação do fundo clima, incorporando financiamento de inovação tecnológica e sustentabilidade. (LEILA SALIM)

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