Ratificação de acordo do clima no Senado transcendeu partidos e ideologia
Sessão de aprovação acelerada teve petista na presidência, ruralista na relatoria e elogio de tucano, num raro episódio de consenso político em meio à polarização nacional, afirma Alfredo Sirkis
ALFREDO SIRKIS
ESPECIAL PARA O OC
A autorização final para a ratificação do Acordo de Paris pelo Senado aconteceu em tempo recorde e conseguiu ser mais ligeira que a da Câmara. Pouco mais de dois meses depois do lançamento da campanha Ratifica Já! Pelo Centro Brasil no Clima, Instituto Clima e Sociedade, Observatório do Clima, SOS Mata Atlântica e dezenas de outras entidades, praticamente ratificados estamos, faltando apenas a sanção presidencial. Esta deve ocorrer quase certamente em setembro, depois da Olimpíada e do desenlace da crise política do impeachment.
O Brasil, assim, tornar-se-á o primeiro país de grande economia a ratificar o Acordo de Paris. Vale a pena ressaltar o extraordinário empenho de alguns parlamentares. Na Câmara, o deputado Evandro Gussi (PV-SP) articulou o regime de urgência. No Senado, o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), relator da Comissão Mista de Mudanças Climáticas, além de articular a urgência ainda obteve com o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL), o vice, Jorge Viana (PT-AC) e os líderes dos partidos a sua inclusão numa sessão onde se dava a visita do embaixador do Marrocos, país que vai sediar em novembro a COP22.
A grande curiosidade da votação foi o fato da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), ex-ministra da Agricultura, ter sido a relatora oral da Comissão de Relações Exteriores com um parecer favorável e uma vibrante defesa da agricultura de baixo carbono. A sessão foi presidida pelo vice-presidente do Senado, Jorge Viana, do PT. Os senadores José Agripino (DEM-RN), Antonio Anastasia (PSDB-MG) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) apoiaram o relatório de Kátia Abreu. O presidente da Comissão de Relações Exteriores, Aloysio Nunes (PSDB-SP), notou que o relatório da colega é uma demonstração de que é possível construir ampla convergência, apesar das eventuais divergências entre os parlamentares.
O Brasil, assim, não apenas está em vias de aderir ao novo acordo do clima, mas também o faz de forma exemplar, num consenso politico transpartidário e transideológico que afasta do cenário qualquer veleidade de negacionismo climático. É um microcosmo da postura que todos os países deveriam adotar, a começar pelos EUA, onde a maioria do Congresso e o candidato republicano à Presidência continuam negando a ciência. Agora ainda temos nosso vasto dever de casa: tirar do papel a INDC, o plano climático nacional, preparar logo seu primeiro ciclo de revisão e um plano de longo prazo de descarbonização da economia brasileira.
Alfredo Sirkis é jornalista, escritor e diretor-executivo do Centro Brasil no Clima, e um dos criadores da campanha Ratifica Já!. Foi presidente da Comissão Mista de Mudanças Climáticas do Congresso Nacional