Imagem aérea de desmatamento próxima à Flona do Jacundá, em Rondônia (Foto Bruno Kelly/Amazônia Real)

#PRESS RELEASE

STF suspende lei que ameaça Moratória da Soja

Decisão da corte tem caráter liminar; ADIs pedem a suspensão de novas leis que têm potencial para acabar com mais bem-sucedida iniciativa de combate ao desmatamento na Amazônia

27.12.2024 - Atualizado 27.12.2024 às 16:28 |

DO GREENPEACE – No último dia 23, partidos políticos protocolaram duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) com pedido de medida cautelar no Supremo Tribunal Federal (STF) referente às novas leis em Mato Grosso (lei 12.709/24) e Rondônia (lei 5.837/2024) que ameaçam a Moratória da Soja – um acordo voluntário multissetorial que tem se mostrado eficaz para frear o desmatamento da Amazônia e que ampliou o mercado dessa commodity. Na prática, as recentes mudanças feitas pelos estados em tais normas incentivam o desmatamento no bioma e prejudicam a luta contra as mudanças climáticas, que já têm produzido efeitos catastróficos ao meio ambiente e à população, com grandes impactos para o próprio setor do agronegócio.

Após o protocolo das ADIs (texto referente ao MT; texto referente à RO), o Ministro do STF, Flávio Dino, suspendeu de forma liminar a lei estadual de MT na quinta-feira (26). Tal lei restringiria a concessão de benefícios fiscais e de terrenos públicos a empresas comprometidas com a Moratória da Soja e que tenham políticas internas de compra que busquem evitar a aquisição de bens agrícolas produzidos em áreas desmatadas após 2008. A lei 12.709/24 havia sido sancionada pelo governador Mauro Mendes (União Brasil) em outubro e entraria em vigor em janeiro.

Propostas por quatro partidos (PCdoB, PSOL, PV e Rede Sustentabilidade), as ADIs incluem o pedido de liminar para suspender as leis até a conclusão do processo, já que a entrada em vigor das legislações seria suficiente para que seus efeitos tributários surtam efeito, agindo como um motivador para que as empresas que cumprem a Moratória abandonem o pacto.

As ADIs são cruciais para evitar esses retrocessos ambientais e buscam a confirmação por parte do STF que as leis 12.709/24 e 5.837/2024 usurpam a competência da União em diversas matérias, ofendendo a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do meio ambiente.

O WWF-Brasil e o Greenpeace Brasil solicitaram ingresso nas ADIs como amicus curiae, ou amigo da Corte, cumprindo a sua missão institucional de oferecer suporte técnico e jurídico para auxiliar o STF em sua decisão.

“Celebramos a decisão do ministro Flávio Dino, que deferiu medida cautelar para suspender a eficácia da Lei Estadual nº 12.709/2024 de Mato Grosso. Essa, no entanto, não é a única ameaça legislativa à Amazônia. Diversas leis nos estados da Amazônia, assim como no Congresso Nacional, visam impedir medidas do setor privado para eliminar o desmatamento das suas cadeias produtivas. Trata-se,
evidentemente, de um ataque orquestrado à Moratória da Soja, o mais bem-sucedido acordo multissetorial de preservação do meio ambiente, que nos últimos 18 anos retirou a soja dos vetores de desmatamento da Amazônia sem que isso tenha afetado a produção da oleaginosa no bioma”, diz Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil.

“Nessas quase duas décadas de vigência da Moratória, a área plantada com soja na Amazônia passou de 1,64 milhão de hectares, em 2007, para 7,28 milhões de hectares em 2022, sendo que, desse total, apenas 250 mil hectares foram oriundos de áreas desmatadas após 2008, ano-base do acordo. Os números falam por si: a Moratória não é um impedimento ao crescimento do agronegócio nacional. Ela é um impedimento ao desmatamento, em linha com acordos globais de clima, biodiversidade e até comerciais, como a legislação europeia contra a importação de produtos oriundos do desmatamento.

A ciência já provou a importância da Amazônia para o clima mundial e para o regime de chuvas no Brasil, do qual depende nossa segurança elétrica e hídrica – e do qual depende também o agronegócio brasileiro. Não é possível que os interesses isolados de poucos especuladores de terra sejam colocados acima do bem comum dos brasileiros. Os próprios produtores já são afetados pela falta de chuvas
provocada pelo desmatamento da floresta”, completa Voivodic.

Inconstitucionalidade

As ADIs evidenciam que as novas leis têm vícios de inconstitucionalidade formal. A proibição de concessão de benefícios fiscais às empresas com base em sua adesão a tratados ou acordos internacionais viola o princípio da competência tributária e extrapola a competência do Estado ao interferir em práticas comerciais legítimas e compromissos voluntários.

Tais leis também contêm uma série de incongruências materiais, como a violação de princípios constitucionais orientadores da ordem econômica, violações ao direito adquirido, aos direitos humanos, à defesa do meio ambiente como princípio basilar do sistema tributário nacional, bem como a violação ao direito fundamental da proteção ambiental, retrocedendo no combate à crise climática.

“Tanto a lei do MT, quanto a de RO, violam frontalmente princípios constitucionais que orientam a ordem econômica, o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a defesa do meio ambiente como pilar do sistema tributário nacional e comprometem o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o dever de proteção ambiental, o princípio da vedação ao retrocesso na proteção ambiental. Ao eliminar
incentivos fiscais, tais lei penalizam as empresas que ampliam voluntariamente seus compromissos ambientais, como o acordo multissetorial da Moratória da Soja, fundamental para combater o desmatamento e mitigar os efeitos das mudanças climáticas”, explica Angela Barbarulo, gerente jurídica do Greenpeace Brasil.

Próximos passos para a liminar no MT

Com a decisão do Ministro Dino, agora, a Corte irá referendar a liminar em fevereiro. “A liminar suspendendo a lei do MT foi uma grande vitória para a Moratória da Soja e para o meio ambiente. As leis aprovadas em Mato Grosso e Rondônia estão em total desalinhamento com o objetivo de Desmatamento zero estabelecido pelo governo federal. Mais do que condenar a Moratória da Soja, que deu comprovadas contribuições para a redução do desmatamento, tais legislações incentivam o desmatamento, aumentando a percepção de risco da soja brasileira no mercado global. Além dos aspectos inconstitucionais, também é um absurdo vedar incentivos para aqueles que fazem mais pelo
meio ambiente, a lógica deveria ser a oposta”, afirma a coordenadora de Florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.

A nova lei de Mato Grosso faz parte de uma série de ataques à Moratória da Soja que têm sido construídos no cenário político, além de dar fôlego à proliferação de leis nacionais e subnacionais que buscam o enfraquecimento de iniciativas voltadas à redução do desmatamento na Amazônia Legal. A própria Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) – uma das instituições mais ativas contra o acordo – e a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), já deram a entender que a lei 12.709/24 representa o fim da Moratória da Soja.

Quanto à ADI que questiona a lei de RO, que está sob a relatoria do Ministro Dias Toffoli, ainda não houve decisão do STF. Exemplo bem-sucedido de redução de desmatamento em cadeias produtivas A Moratória da Soja é a iniciativa mais bem sucedida do mundo de conciliação do desenvolvimento da produção agrícola de larga escala com a responsabilidade ambiental, em seu quesito mais crítico, que é o do desmatamento-zero. Ao vetar a compra de soja produzida em áreas desmatadas após julho de 2008, o acordo gerou o melhor aproveitamento de áreas já desmatadas, mas subutilizadas ao mesmo tempo que não impediu a expansão dos plantios de soja no país, na Amazônia ou mesmo em Mato Grosso e Rondônia, apenas a direcionou para áreas de pastagens degradadas.

Os dados comprovam: enquanto os municípios monitorados pela Moratória tiveram uma redução de 69% no desmatamento (entre 2009 e 2022), a área plantada de soja no bioma Amazônia cresceu 344%. Neste mesmo período, o Brasil se tornou o maior exportador de soja no mundo e é responsável por mais de um terço do grão produzido globalmente.

Além disso, a Moratória da Soja é uma forma de garantir o acesso aos produtos ambientalmente responsáveis a mercados internacionais cada vez mais exigentes, melhorando a imagem do Brasil como país ambientalmente comprometido e conservando uma das nossas maiores riquezas. Caso sejam mantidas as alterações das leis do Mato Grosso e de Rondônia, os mercados importadores estarão novamente ligados à destruição da Amazônia, comprometendo a boa reputação da soja brasileira, estabelecida ao longo dos 18 anos de vigência do pacto multisetorial.

Contatos para a imprensa

Greenpeace Brasil
Laís Modelli, coordenadora de imprensa: (14) 98127 9058

WWF Brasil
Solange Azevedo, coordenadora de engajamento: (11) 94330-9646

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