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“Temos que abraçar o sonho para adiar o fim do mundo”

Americano que escreveu manual de ativismo climático diz que se inspirou em escritor brasileiro para militância

17.03.2021 - Atualizado 11.03.2024 às 08:29 |

DO OC – Na medida em que cresce a consciência sobre as devastadoras consequências das mudanças climáticas, aumenta também a dúvida sobre como ajudar a combater esse problema tão imediato. Foi pensando nisso, e a partir dos aprendizados adquiridos ao longo de anos de ativismo, que o americano Daniel Hunter, membro da 350.org., lançou em 2019 o Manual de Resistência Climática: Ou “eu fiz parte de uma ação pelo clima. E agora?”.

Disponível gratuitamente para download, a obra – com prefácio por Greta Thunberg -, reúne aprendizados do movimento por justiça climática, desconstrói mitos sobre como os movimentos sociais se tornam vitoriosos e ensina estratégias para estruturar campanhas criativas e de impacto. O autor explica, por exemplo, por que não há necessidade de unidade interna total para que um movimento seja eficiente, quais são os passos iniciais para tirar uma boa ideia do papel, além de trazer exemplos pessoas sobre como começou a se tornar referência no tema.

Na Semana da Ação Pelo Clima, Daniel conversou com o OC sobre sua trajetória, motivações e percepções sobre como evoluir na luta contra as mudanças climáticas. Confira:

O que o motivou a iniciar um trabalho voltado à mobilização social? Quais os principais aprendizados ao longo desse caminho?

 Sempre adorei animais. Portanto, cuidar do meio ambiente sempre fez sentido para mim. Mas, na verdade, comecei “não me importando” com a mudança climática quando tinha treze anos. Eu tinha ouvido falar tanto que a mudança climática estava chegando e destruiria o planeta que passei a acreditar que não havia nada que um adolescente como eu pudesse fazer. Então eu desisti. Felizmente, logo mudei minha visão. O conceito de Ailton Krenak é verdadeiro para mim: temos que abraçar o sonho para adiar o fim do mundo. É forma de sobreviver mais saudável que podemos ter. E isso significa perceber que somos um povo que sobrevive. Como afro-americano, sei que meu povo sobreviveu à escravidão, aos abusos e a longas noites de escravidão e desespero. Podemos sobreviver e prosperar mesmo assim. Saber que essa luta é sobre a sobrevivência de meus filhos e netos faz com que valha a pena estar nessa luta.

O que o direcionou para um trabalho com uma postura não-violenta, de organização e ação direta?

De alguma forma acabei vendo o filme Gandhi quando tinha cinco anos. O que me impressionou foi uma maneira insistente e não passiva de fazer a mudança – uma maneira de mostrar o que você representa. Embora eu sempre possa usar uma arma para intimidar, o poder da ação não violenta é o poder de mudar o coração das pessoas. E, se eu não posso mudar seus corações, pelo menos posso impedi-los de fazer o mal.

A ideia de escrever um manual para jovens que querem começar a fazer parte dessa comunidade de ação climática veio da sua própria experiência de não ter um guia lhe ajudando no seu início?

Um de meus amigos que estava envolvido na organização de uma greve climática uma vez me disse: “Ei, você deveria nos dar algumas lições com sua experiência de organização”. Então, anotei lições que gostaria de ter aprendido – coisas sobre como as ações podem se tornar violentas e raivosas, ou suaves e silenciosas. O poder das ações consiste em combinar nossos sentimentos e as pessoas com quem trabalhamos em uma ação estratégica que ajudará a mover outras pessoas. Eu gostaria de ter tido mais opções e informações, então decidi contar histórias de pessoas de todo o mundo.

Que mudanças – positivas ou negativas – você percebe na sociedade desde quando começou nessa trajetória?

Os movimentos passam por alguns estágios previsíveis. Sobre as mudanças climáticas, há uma consciência muito mais ampla do problema. Esse é o primeiro passo para qualquer movimento social. Em grande parte, vencemos essa luta. Agora temos que provar que as elites não têm a solução, que suas ofertas baratas e os pequenos ajustes que estão dispostos a fazer não são suficientes. De certa forma, eu vejo também estamos começando a vencer essa luta. Agora estamos propondo soluções radicais e inovadoras – e defendendo que elas aconteçam. Portanto, progredimos de muitas maneiras, embora ainda não tenhamos visto as grandes mudanças que buscamos.

No livro, você fala sobre treinamento experimental para ativistas. Como você definiria isso?

Quando eu estava na escola, uma professora sentou-se na frente da sala e me disse o que achavam que eu deveria saber. Eu penso na educação experiencial como um aceno ao método de ensino de Paulo Freire: não dizendo às pessoas, mas oferecendo experiências e convidando-as a refletir sobre suas próprias vidas e o significado que fazem dela. Portanto, a educação começa com as próprias experiências do indivíduo que o orienta através de um processo de reflexão e construção de significado onde as pessoas encontram em suas próprias soluções coletivas para seus próprios problemas. É a estratégia perfeita para as organizações porque é isso que temos que fazer para construir campanhas que tenham impacto. Não podemos confiar apenas nas lições de campanhas anteriores.

Quais são seus conselhos para quem deseja começar a organizar uma mobilização em prol do clima?

Reúna alguns amigos, reúna um grupo. Você pode usar o livro como um guia para ajudá-lo a escolher algumas campanhas locais para trabalhar. Comece com uma vitória significativa: algo como fazer uma empresa adotar a energia solar, fazer uma cidade proibir o fraturamento hidráulico ou fazer sua escola ensinar mudança climática para seus alunos. Assim você começa a desenvolver alguns “músculos” da campanha. Encontre outras pessoas sendo ativas – e permaneça ativo. O ato mais perigoso é não fazer nada.

Para o download completo do livro, clique aqui.

 

 

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