“Todo ministro terá obrigação com clima”, diz Lula com Marina
Candidato recebe de ex-ministra propostas para reconstrução da agenda ambiental no Brasil, começando com retomada de planos contra desmatamento
DO OC – No primeiro encontro público após sete anos de ruptura, Luiz Inácio Lula da Silva recebeu de sua ex-ministra Marina Silva um conjunto de 26 compromissos de “resgate atualizado da agenda socioambiental brasileira”. O documento foi a condição da fundadora da Rede Sustentabilidade para declarar seu apoio à candidatura do petista à Presidência da República.
Entre as propostas estão a criação de uma autoridade nacional de segurança climática e a retomada e a ampliação dos planos de prevenção e controle do desmatamento na Amazônia e no Cerrado e sua expansão para os outros biomas do país. Conhecido como PPCDAm, o plano para a Amazônia foi a maior contribuição de Marina em sua passagem pelo Ministério do Meio Ambiente no governo Lula (2003-2008), e é considerado o principal fator por trás da queda de 83% na taxa de desmatamento verificada entre 2004 e 2012.
O PPCDAm, que vinha perdendo eficácia desde o governo Dilma, foi engavetado por Jair Bolsonaro e revogado. O desmatamento na Amazônia explodiu a partir de 2019 e iniciou a série de 2023 (medida de agosto deste ano a julho do ano que vem) com sinais preocupantes de alta.
A reaproximação foi iniciada no fim de semana, com um encontro de duas horas entre os dois, e selada com uma entrevista coletiva nesta segunda-feira em São Paulo, onde Marina disputa uma vaga de deputada federal.
O esperado pedido de desculpas do ex-presidente à ex-ministra pelos golpes abaixo da cintura dados nela pelo PT em 2014 não veio. Mas Lula, que chamou o reencontro de “um dia histórico para quem sonha em fortalecer a democracia em nosso país”, acenou com a incorporação das propostas levadas por Marina em seu programa, como uma linha de crédito para adaptação à mudança do clima e o avanço na implementação do Cadastro Ambiental Rural.
Lula também repetiu que acabará com o garimpo ilegal no país e apoiou a transversalidade da questão climática, que os sustentabilistas vêm insistindo há décadas que não pode estar confinada à área ambiental do governo.
“Quando a gente ganhar as eleições não haverá no nosso governo política de ministro. A política ambiental será tratada de forma transversal. Ou seja, todos os ministros terão obrigação com a questão climática. Não é o ministro do Meio Ambiente o único responsável, a política será responsabilidade de todos, do presidente ao ministério menor”, declarou o candidato.
A cúpula da Rede já havia liberado os integrantes do partido para apoiar Lula ou Ciro Gomes (PDT). Alguns, como o senador Randolfe Rodrigues (AP), já haviam entrado na campanha de Lula. Mas a própria Marina ainda não havia tomado uma decisão.
Uma das fundadoras do PT no Acre, a ex-senadora vinha se afastando de Lula desde 2008, quando o ex-presidente, pressionado por governadores da Amazônia, ameaçou revogar um decreto que cortava crédito de desmatadores – um dos instrumentos mais efetivos do PPCDAm. Isso causou sua saída do governo. Em 2010, Marina concorreu à Presidência da República contra a candidata de Lula, Dilma Rousseff, e teve 19 milhões de votos.
Em 2014, após a morte de Eduardo Campos, cabeça de sua chapa, Marina assumiu a corrida presidencial e estava à frente de Dilma. A petista, cujo marqueteiro era João Santana, fez uma série de ataques a Marina na televisão, usando alegações falsas, como a de que a independência do Banco Central, defendida pela acreana, iria deixar os pobres sem comida. A ofensiva surtiu efeito: Marina perdeu a vaga no segundo turno para Aécio Neves, a quem apoiou, rompendo definitivamente com Lula e o PT. Hoje João Santana, que chegou a ser preso na Lava Jato, cuida da campanha de Ciro Gomes.
Lula jamais pediu desculpas publicamente a Marina. O reatamento entre os dois leva o nome de Jair Messias Bolsonaro.
“Nosso reencontro político e programático se dá diante de um quadro grave da história política, econômica, social e ambiental do nosso país, em que nós temos o que eu considero a ameaça das ameaças, que é a ameaça à nossa democracia”, afirmou.
Questionada por jornalistas sobre críticas a Lula no passado, Marina disse: “A polarização aconteceu. Mas agora estamos diante de um quadro que é democracia ou barbárie, democracia ou aniquilação dos povos indígenas. Democracia ou aniquilação do povo preto, que está morrendo na periferia. Democracia ou destruição da Amazônia. Porque na base da democracia é que haveremos de reconstruir essas políticas.” E prosseguiu: “Ninguém precisa abrir mão do exercício da crítica, mas existe algo que é mais importante e que nos une”.