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“Renováveis não bastam para cumprir 2oC”

Para pesquisador, foco excessivo em energia eólica e solar pode retardar desenvolvimento de tecnologias necessárias para fechar a conta do Acordo de Paris, como captura de carbono e baterias

30.01.2017 - Atualizado 11.03.2024 às 08:27 |

CLAUDIO ANGELO
DO OC

Um grupo internacional de cientistas acaba de desenvolver um método simples para avaliar se o mundo está no rumo de cumprir a meta do Acordo de Paris de estabilizar o aquecimento global em menos de 2oC. A conclusão é que estamos ao menos na direção certa. Mas não por muito tempo.

A partir de 2030, dizem os pesquisadores, a trajetória de descarbonização da economia mundial necessária para estabilizar a temperatura da Terra em níveis mais ou menos “seguros” passará a divergir drasticamente das ações de redução de emissões propostas no primeiro ciclo de compromissos de Paris. Uma forte aceleração dessas reduções precisará ser feita – e apenas as tecnologias existentes hoje, como a energia eólica e a solar, não deverão dar conta do recado.

“O grande risco é focarmos demais em fazer as coisas fáceis e menos nas difíceis”, disse ao OC Glen Peters, cientista-sênior do Cicero (Centro de Pesquisa de Clima) de Oslo, Noruega. “A instalação de energia eólica e solar é necessária, mas não suficiente. Chegar a emissão líquida zero no meio do século vai demandar tecnologias que façam o trabalho pesado, como captura de carbono e armazenamento de energia”, afirmou.

E estas nem de longe estão onde deveriam estar para dar algum respiro à humanidade.

Nesta segunda-feira, Peters e mais sete colegas publicaram no periódico Nature Climate Change uma espécie de equação do progresso climático. Chamada Identidade de Kaya, ela consiste, grossíssimo modo, em avaliar as emissões de CO2 com base em informações sobre três fatores: crescimento do PIB, intensidade energética e intensidade de carbono na economia. Se o PIB de um país, região ou do mundo inteiro cresce 3%, então os outros dois fatores terão de cair mais do que isso para as emissões caírem junto.

O cálculo pode ser usado para informar os governos durante os ciclos de revisão das metas de Paris (as NDCs), previstos para acontecer a cada cinco anos. Só que ele produz algumas verdades inconvenientes.

A mais espinhosa foi apontada pelo economista canadense Christopher Green em comentário ao estudo na mesma edição da Nature Climate Change: para atingir a meta de menos de 2oC, será preciso uma redução de 5% por ano nas emissões globais de CO2. Chegar lá com um crescimento anual de 2% no PIB do planeta exigiria que a intensidade de carbono da economia caísse 7% ao ano. Entre 2010 e 2015, ela caiu 2,1% ao ano. Como um crescimento global de 2% é considerado pífio pelos economistas, a intensidade de carbono precisa cair muito mais. “Essa nova análise sugere que nós podemos não estar prontos tecnologicamente”, escreveu Green.

As renováveis têm tido um crescimento impressionante: quintuplicaram entre 2000 e 2015. E contribuíram para reduzir as emissões, em especial na Europa. Nos EUA, o caso mais bem-sucedido de corte de CO2, o grande responsável foi o gás natural, que substituiu o carvão – não o vento e o sol. Na China, o percentual de fósseis na matriz caiu devido à expansão das renováveis, mas o principal fator a controlar as emissões tem sido a desaceleração do PIB.

Quando visto em perspectiva, mesmo esse crescimento acelerado das fontes não-poluentes parece pífio diante da tarefa de estabilizar o clima: elas saíram de 0,55% para 2,77% do total. Green lembra que esse crescimento deverá ser em grande parte compensado pelo declínio de 2% do uso da energia nuclear após o desastre de Fukushima.

“O crescimento das renováveis é impressionante e importante, mas precisamos acelerá-lo”, disse Peters. “As renováveis não têm substituído os combustíveis fósseis, certamente não na escala necessária, e precisamos entender por quê”, prosseguiu. “Dar muito crédito para as renováveis significa que perderemos outras coisas importantes.”

A captura e armazenamento de carbono (CCS) e a bioenergia com captura de carbono (Bio-CCS, ou BECCS) estão entre essas coisas importantes. A maioria das projeções de emissões futuras consistentes com a meta de Paris envolve quantidades colossais de CCS e BECCS, mas no mundo real essas tecnologias ainda não fazem nem cócegas no CO2 solto por aí. Segundo o novo estudo, será preciso criar 4.000 plantas de CCS até 2030. O número proposto até 2020 está na casa das dezenas.

O Bio-CCS é uma tecnologia ainda mais complicada, porque praticamente não existe no mundo real em escala significativa. Além disso, enfrenta críticas de ambientalistas e de pesquisadores. O próprio Glen Peters é coautor de um artigo, publicado no ano passado, que chama o BECCS de “risco moral” – por possivelmente criar competição por uso da terra e uma certa indolência por parte de alguns países, que deixariam de cortar CO2 para investir nessa tecnologia, que pode não funcionar.

Tudo somado, a mensagem dos cientistas é uma só e simples: é preciso fazer de tudo e fazer agora para cortar emissões de energia e dar escala às outras tecnologias se quisermos ter alguma chance de evitar quebrar a barreira de 2oC. Peters diz que a chance neste momento é “zero”. “Ou pelo menos é muito difícil. Mas isso não significa que não devamos tentar.”

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