Ajuste em meta não amplia esforço, diz SEEG
Análise mostra que, se corrigir a INDC e cumprir políticas prometidas, país chegará a 2030 emitindo 1,047 bilhão de toneladas de CO2, 12% menos do que estimativa oficial
Uma análise inédita do plano climático submetido pelo Brasil para o Acordo de Paris indica que as emissões nacionais de gases de efeito estufa em 2030 podem ser ainda menores do que as calculadas pelo governo caso esse plano (INDC) seja cumprido. Isso ocorrerá mesmo que o país ajuste sua meta à luz de novos dados, que mostram que nossa conta climática no passado é maior do que se imaginava.
O novo cálculo foi feito pela equipe do SEEG (Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa), do Observatório do Clima, que lançou nesta terça-feira em São Paulo uma série de estudos detalhados da trajetória de emissões do país de 1970 até 2014 – e de suas projeções para os próximos 15 anos.
Segundo as contas da equipe do SEEG, as políticas e ações listadas pelo governo brasileiro no anexo da INDC como instrumentos para cumprir a meta poderiam levar o país a chegar em 2025 emitindo 1,369 bilhão de toneladas de CO2 equivalente. Em 2030, as emissões cairiam para 1,047 bilhão de toneladas. Nos documentos da INDC, submetidos à ONU em setembro de 2015, o governo estima que nossas emissões atinjam de 1,3 bilhão de toneladas em 2025 e 1,2 bilhão em 2030 caso essas políticas sejam todas implementadas.
Pela INDC, o Brasil se compromete a cortar 37% de suas emissões até 2025 e 43% até 2030 em relação aos níveis de 2005. Para chegar lá, o país lista uma série de compromissos em vários setores até 2030: restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de matas, recuperar 15 milhões de hectares de pastos degradados, atingir de 28% a 33% de energias renováveis não-hidrelétricas na matriz e zerar o desmatamento ilegal na Amazônia.
Acontece que o governo federal usou como referência para estimar as emissões o Segundo Inventário Nacional de emissões, publicado em 2010, que calcula em 2,133 bilhões de toneladas de CO2 equivalente nossas emissões em 2005. Uma nova metodologia para estimar as emissões por desmatamento foi estabelecida no Terceiro Inventário, publicado em 2016, e mostra que nossa conta climática no passado era maior: na verdade, o Brasil emitiu 2,8 bilhões de toneladas em 2005.
Caso não ajuste a INDC para refletir essa mudança, o país chegará a 2025 podendo ter uma emissão líquida 1,7 bilhão de toneladas e a 2030 podendo emitir 1,6 bilhão – e cumpriria sua meta mesmo assim. Ou seja, em vez de cortar emissões, poderíamos aumentá-las em 21% em relação a 2014 (quando emitimos 1,3 bilhão de toneladas segundo dados do SEEG). “Isso criaria um constrangimento enorme para o Brasil num momento em que o país se prepara para colher aplausos da comunidade internacional por ser um dos primeiros grandes poluidores a ratificar o Acordo de Paris”, disse André Ferretti, gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima.
O OC tem defendido que o governo ajuste a meta de acordo com o Terceiro Inventário, para 53% em 2025 e 57% em 2030, assumindo como limites máximos os valores absolutos respectivos de 1,3 bilhão e 1,2 bilhão de toneladas expressos no anexo da INDC. Tal ajuste deveria ser feito no momento da ratificação do acordo, marcada para 12 de setembro. Nessa data, nossa INDC (Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida) vira NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada), ou seja, ela deixa de ser uma intenção para virar compromisso oficial do país.
“A boa notícia é que o governo não precisa ter medo de fazer o ajuste”, diz Tasso Azevedo, coordenador do SEEG. A análise da INDC com base no Terceiro Inventário mostra que a meta pode ser ajustada neste momento para 53% em 2025 e 57% em 2030 sem que haja necessidade de alterar nenhuma das políticas propostas.
Qual é a mágica? Azevedo explica: o a metodologia do Terceiro Inventário teve avanços sobre a forma de calcular emissões e remoções. Se por um lado as emissões por hectare desmatado aumentaram com os novos dados de biomassa, por outro lado, as informações sobre remoções de carbono por florestas secundárias – que crescem em áreas agrícolas abandonadas, por exemplo – também aumentaram. “O que esses dados mostram é que o sequestro de carbono por essas florestas é muito maior do que se imaginava”, diz Azevedo. “Assim, no período em que o desmatamento era alto, como em 2005, as emissões do pais foram revisadas para cima, mas em 2030 com níveis de desmatamento muito menores o destaque fica para as remoções, que também cresceram.” Caso o desmatamento fosse zerado em todos os biomas, o potencial de reduções seria ainda maior – poderíamos atingir emissões pouco mais de 800 milhões de toneladas de CO2 equivalente.
“A mensagem é que há espaço para o país aumentar seu grau de ambição climática, especialmente zerando o desmatamento”, disse Carlos Rittl, secretário-executivo do OC. Isso colocaria o país no rumo de adequar sua meta ao esforço necessário para limitar o aquecimento global em menos de 2oC – a proposta do Brasil, como a da maioria dos outros países, é insuficiente hoje. “Nossa recomendação ao governo é que realize o ajuste agora para refletir os novos dados e assuma desde já o compromisso, em conjunto com outros países, de rever suas metas em 2018 para aumentar seu grau de ambição.”
Leia o relatório-síntese do SEEG 2015 aqui.